Agricultura brasileira poderia reduzir o uso de agrotóxicos e aumentar os lucros

0
304
Site do Café

Produção sustentável, ​ que alia o agronegócio à conservação da natureza, é alternativa para deixar de usar venenos nos cultivos.

A agricultura brasileira é a mais tóxica do mundo. Há sete anos, o país ocupa o primeiro lugar no uso de agrotóxicos, com crescimento aproximado de 190%, segundo dados da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Apesar de o setor agrícola ser responsável por ​esse cenário alarmante, ainda é possível mudar, alterando esse padrão de uso. Estudos da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) mostram que é possível reduzir em até 50% o uso de agroquímicos com a adoção do Manejo Integrado de Pragas.

De acordo com professor Carlos Hugo Rocha, da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), que acompanha pesquisas nos campos gerais paranaenses, existe um caminho para diminuir e acabar de vez com o consumo de agrotóxicos. “Com a agricultura ecológica – que alia conservação da natureza à produção de alimentos –, o uso de novas tecnologias, o conhecimento empírico dos agricultores e as iniciativas do poder público podemos diminuir o consumo de produtos químicos em poucos anos e promover uma transformação ecológica na agricultura do país”, afirma Rocha, que é doutor em Gestão de Recursos Naturais pela Universidade do Estado do Colorado (EUA) e membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza.

Na prática, porém, o caminho da agricultura brasileira vai ​na contramão. De acordo com pesquisa dos Indicadores de Desenvolvimento Sustentável (IDS), o agricultor brasileiro utiliza cerca de sete quilos de agrotóxicos por hectare, enquanto dez anos atrás o consumo era de menos de três quilos, uma variação de mais de 150%. “O próprio governo financia esse uso de agrotóxicos por meio de incentivos e subsídios ao produtor rural”, afirma Rocha.

A consequência do uso sem controle reflete diretamente na saúde do brasileiro, dos trabalhadores rurais e, até mesmo, na vida de todos os seres vivos. Com base nos dados do Sistema de Monitoramento do Comércio e Uso de Agrotóxico (SIAGRO) da Agência de Defesa Agropecuária (ADAPAR), da Secretaria de Estado de Agricultura e Abastecimento (SEAB-PR), em 2011, o volume total de agrotóxicos comercializados no Paraná – terceiro maior Estado consumidor do Brasil –, foi de 96,1 milhões de kg, o que corresponde a quase 10 kg de agrotóxicos por habitante. Já no oeste ​paranaense,​ na região de Cascavel, são utilizados nas áreas cultivadas entre de 10 a 14 kg/hectare/ano. Evidentemente esses produtos entram nos ecossistemas, contaminado solos, água, alimentos e vida silvestre.

Segundo a Anvisa, a cada três amostras coletadas em diversas capitais brasileiras, duas estão contaminadas, sendo que uma tem resíduo acima do permitido. Os alimentos com os maiores índices de contaminação por agrotóxicos são: pimentão (92%), morango (63%), pepino (57%), alface (54%), cenoura (49%), abacaxi (32%), beterraba (32%) e mamão (30%). “Consumimos cada vez mais alimentos com resíduos de agrotóxicos em níveis inaceitáveis”, alerta o professor.

 

UM NEGÓCIO​ TÓXICO E PERIGOSO

O uso de agrotóxicos, como aponta o doutor, é um negócio impulsionado pelo aumento da produção. De acordo com a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), a área plantada do Brasil aumentou 78%, em 40 anos, enquanto o uso de agrotóxicos subiu 700%. Para efeito comparativo, o crescimento mundial de agroquímicos foi de 93%, bem abaixo da média brasileira​, mas ainda assim preocupante​.

“O consumo se torna um círculo vicioso e sem fim. O uso intensivo de fertilizantes no solo favorece, inclusive, o surgimento de novas pragas e doenças, pois acabam desenvolvendo resistência aos ingredientes ativos aplicados. Por isso, as indústrias sempre produzirão novos produtos químicos”, explica Rocha, que complementa: “com o tempo, os agrotóxicos perdem sua efetividade, fazendo com que o agricultor aumente dosagens e o número de aplicações”.

Prova disso é o número de pragas e doenças existentes nas lavouras brasileiras. Até o início dos anos 1960, como conta Rocha, período anterior ao uso de agrotóxicos no Brasil, existiam em torno de cem insetos considerados pragas. “Desde então, esse número não parou de crescer. Em 20 anos, aumentou para mais de 400”, explica o professor. Ele lembra que há 15 anos, por exemplo, os produtores não imaginavam a necessidade de pulverização por fungicida na produção de soja. “Em ambientes mais antropizados, com pequena presença de elementos naturais, surgiram os primeiros focos de ferrugem da soja, amplamente disseminados nas lavouras nos anos seguintes”, lembra Rocha, complementando que hoje são necessários de três a cinco aplicações de fungicidas para o controle da doença.

 

PROTEGER O MEIO AMBIENTE PARA PLANTAR

Reduzir drasticamente o consumo de agrotóxicos nas propriedades rurais brasileiras é o grande desafio do setor agrícola. Para Rocha, a luz do fim do túnel é a produção que valoriza a conservação de áreas naturais nativas, solo e água.  Ele explica que a produção orgânica aliada a sistema agroflorestais contempla um sistema produtivo ambientalmente correto e, por isso, consegue se sustentar fazendo uso racional dos recursos naturais. Os alimentos são produzidos da maneira mais natural possível e, por não contemplar o uso de insumos químicos, fertilizantes e pesticidas, evitam a contaminação do solo e dos recursos hídricos; além de serem mais benéficos à saúde.

“Dessa forma, o produtor também contribui prestando serviços ambientais”, conta Rocha, ressaltando que essa estratégia promove um equilíbrio que favorece a própria produção. “A matéria orgânica do solo estimula o controle natural de pragas; assim a própria natureza combate os organismos, sem fazer uso de agrotóxicos”, explica o doutor.

“Esse modelo para produção de alimentos sem produtos químicos abriu um mercado interessante para agricultura familiar no Brasil”, afirma Rocha. No Paraná, 90% das propriedades são áreas pequenas e muitos agricultores aproveitam parte de sua terra para conservar a natureza. Pesquisas desenvolvidas na UEPG mostram que das 350 propriedades mapeadas, em uma área aproximada de quatro mil hectares, 38% das terras são ocupadas por vegetação nativa. Por exemplo, há propriedades de oito hectares de terra, nos quais três são destinados para agricultura e cinco para vegetação nativa. “Esse papel que o pequeno produtor desempenha na conservação da natureza não é valorizado. Há, portanto, um grande potencial para incentivar a conservação e a produção orgânica nessas propriedades”, esclarece Rocha.

Esse sistema já é realidade na Dinamarca, país com maior comércio de produtos orgânicos do mundo. Com incentivo do governo, o país europeu espera que até 2020 a quantidade de área cultivada para agricultura orgânica seja dobrada. “A Dinamarca pretende que toda sua agricultura se transforme em orgânica”, pontua Rocha. Para isso, espera-se trabalhar em duas frentes: aumentar as terras agrícolas para cultivo orgânico e incentivo para demanda de produtos sem uso de agrotóxicos. “No Brasil, infelizmente, ainda temos um longo caminho para a transformação ecológica da agricultura, mas já existem excelentes exemplos que merecem apoio, como no Paraná, que servem de referência para as demais propriedades do estado”, finaliza.

 

Adubo Para Feijão – 01 QUILO

Deixe uma resposta